Assembleia de Delegados Sindicais de 1 e 2 de Outubro de 2011 – Moção aprovada por unanimidade pelos 60 participantes 

MOÇÃO

A Assembleia de Delegados Sindicais, reunida em Monsaraz entre 1 e 2 de Outubro de 2011, Delibera por unanimidade:

  1. Afirmar que o SMMP e os seus associados estão dispostos a colaborar com o Governo e a Assembleia da República na procura de consensos alargados para a construção de um sistema de Justiça mais célere, mais acessível, mais eficiente e que garanta o reconhecimento dos direitos individuais dos cidadãos;
  2. Manifestar o empenhamento e a disponibilidade dos magistrados do Ministério Público para colaborarem, individual e colectivamente, com todos os intervenientes judiciários (Juízes, Advogados, Solicitadores e Funcionários), na dignificação do sistema de justiça e dos próprios operadores, considerando que tal desígnio só se alcançará com posturas responsáveis e espírito construtivo, num clima de respeito recíproco e de urbanidade, sem prejuízo da divergência de opiniões e da defesa convicta de posições;
  3. Reafirmar a unidade dos magistrados do Ministério Público em torno dos seus princípios constitucionais e estatutários e a sua disponibilidade e empenho em envolverem-se na construção de um Ministério Público renovado, efectivo defensor da Constituição e do Estado de Direito, que reja a sua actuação por critérios de estrita legalidade e objectividade, respeitador do princípio da igualdade de todos os cidadãos perante a lei, capaz de responder eficazmente nas suas várias áreas de acção;
  4. Afirmar a necessidade de valorização do Ministério Público como uma magistratura de iniciativa e elo entre a sociedade, os cidadãos e o sistema judiciário, assumindo-se e cultivando-se uma atitude pró-activa e de intervenção na defesa e promoção dos direitos sociais nas várias áreas de competências do Ministério Público – laboral, menores e família, defesa do ambiente e interesses difusos em geral, defesa da legalidade;
  5. Afirmar que para tal há que encontrar a vontade, a energia e a vitalidade necessárias para organizar o Ministério Público internamente, conferir-lhe maior capacidade de resposta nas várias áreas de acção e especialização, criar mecanismos de coordenação, potenciar as virtualidades da sua estrutura hierárquica, criar uma cultura de liderança e de responsabilização, privilegiar o mérito e a vocação, permitindo, por via do concurso, o acesso aos cargos de topo dos mais capazes e competentes, elevar os níveis de motivação e qualificação que permitam a realização profissional dos seus magistrados, enfim, recriar o Ministério Público no respeito pelos princípios constitucionais, designadamente os da autonomia na sua dupla vertente;
  6. Afirmar que em época de grave crise financeira como a que vivemos, com repercussões na vida dos cidadãos e das famílias, os magistrados do Ministério Publico aqui reunidos manifestam, em seu nome e dos seus representados, a disponibilidade para assumirem de forma mais efectiva, organizada e eficaz as funções de intermediação e procura de soluções de consenso, assim se ponha fim ao imobilismo e à resignação e se encontrem, ao nível da Procuradoria-geral da República, novas formas de organização e de intervenção que potenciem as virtualidades da estrutura hierárquica do Ministério Público e as competências dos seus magistrados;
  7. Constatar que nenhum benefício trouxeram para o Ministério Público as alterações de 2008 ao seu Estatuto, mesmo que reforçando substancialmente, a seu pedido, os poderes do Procurador-Geral da República, e que, apesar desse reforço das suas competências, este continua a invocar uma incompreensível falta de poderes;
  8. Reafirmar a pública discordância dos magistrados do Ministério Público com o projecto pessoal do Senhor Procurador-Geral da República, não sufragado pelo Conselho Superior do Ministério Público, de reforço dos seus poderes, incompatível com a concepção do Ministério Público democrático plasmada na Constituição e defendida de forma consensual, no essencial, por todos os partidos, quer no Governo, quer na oposição;
  9. Louvar as iniciativas das Procuradorias-gerais Distritais, que, na falta do impulso e iniciativa do Procurador-Geral da República, têm assumido a responsabilidade pela uniformização de procedimentos, avançando com projectos de relevo, alertando, porém, para o facto de, precisamente pela falta de âmbito nacional, estas iniciativas poderem contribuir para uma indesejada “regionalização” do Ministério Público;
  10. Manifestar ao Conselho Superior do Ministério Público o desagrado pelo incompreensível atraso na aprovação do regulamento de inspecções, reafirmando a vontade do SMMP de, com urgência, ser convidado a pronunciar-se sobre o mesmo;
  11. Apelar a que o exercício da iniciativa por parte do Procurador-Geral da República e subsequente procedimento disciplinar por parte do Conselho Superior do Ministério Público se pautem pela observância de estritos critérios de legalidade e objectividade, com respeito integral dos direitos de defesa do arguido e com preocupação de uniformização de critérios de escolha e determinação da medida das penas, de forma a assegurar a justiça relativa destas;
  12. Lembrar que a crise das finanças públicas e do próprio regime democrático está também associada à promiscuidade entre o público e o privado, aos negócios ilícitos, à gestão irresponsável dos dinheiros e património públicos, que beneficiam alguns em prejuízo de todos e servem para impor sacrifícios desmesurados ao cidadão contribuinte; que a situação exige das instâncias de supervisão, fiscalização, controle e investigação mais independência, maior eficácia, maior rigor e mais resultados;
  13. Sensibilizar os responsáveis políticos, designadamente o Senhor Presidente da República e o Governo, no actual cenário de necessidade urgente de reforço de transparência e rigor das finanças públicas e da economia, para a importância primordial e decisiva da intervenção do Ministério Público no sistema de justiça, para a premência em serem criadas condições para a sua credibilização e exercício pleno das suas funções, em especial na área da investigação criminal, cujo sucesso é importante factor de prevenção daquele tipo de ilícitos;
  14. Esperar do Governo uma opção clara de aposta no reforço da credibilização do Centro de Estudos Judiciáriosenquanto garante institucional com recorte técnico e deontológico de reconhecido mérito, sem prejuízo do aperfeiçoamento do sistema, como única entidade responsável pelo recrutamento dos magistrados e principal entidade encarregue da sua formação, que deverá assentar, essencialmente:
    1. num tronco comum de formação inicial, mas também no reforço do investimento na formação específica dirigida a cada uma das magistraturas, quer no CEJ, quer ao nível da formação contínua, esta eventualmente alargada a outros profissionais do foro;
    2. no reforço dos critérios e níveis de exigência no recrutamento e na formação;
    3. na necessidade de reequacionar o acesso pela via profissional, hoje injustificadamente facilitado;
    4. no reforço da aptidão dos auditores para a aplicação prática dos conhecimentos académicos;
    5. na triagem, na fase de recrutamento, e na densificação, na fase da formação, da capacidade de decisão como qualidade indispensável dos futuros magistrados;
    6. na consolidação da ideia de que a conduta dos magistrados tem de se pautar sempre pela mais estrita observância das exigências éticas e deontológicas inerentes às suas funções;
  15. Apelar ao Governo, à Senhora Ministra da Justiça e ao novo Director do Centro de Estudos Judiciários para que dêem de imediato início à preparação e organização do concurso para o normal curso de formação inicial de magistrados, enquanto instrumento anual de compensação das saídas, inadiável nas actuais circunstâncias, necessidade acentuada face ao não recrutamento, pela primeira vez, no último ano, de novos magistrados, e ao elevado número de jubilações precipitadas pelas novas regras em vigor;
  16. Recomendar ao Governo que, reduzindo os estágios dos XXVII, XXVIII e XXIX cursos, o faça de modo a garantir sempre pelo menos um ano nesta fase de formação; e que, aproveitando esta situação, gradualmente inicie a redução do número de substitutos, de modo a que, a curto prazo, se consiga extinguir tal figura;
  17. Manifestar preocupação pelas situações, de conhecimento público, que envolvem o actual sistema de acesso ao direito e confirmam a necessidade da sua reformulação, reforçando a qualidade dos serviços prestados pelo Advogado oficioso ao cidadão carenciado, cuja situação jurídica, direitos ou interesses não podem ser prejudicados pela sua condição económica e social, patamar essencial à dignificação da advocacia e do sistema de justiça, equacionado a criação de um corpo de “Defensores Públicos” que, para além de garantir esse reforço da qualidade, permitiria uma relevante redução de custos para o erário público;
  18. Afirmar que a proposta de que, por regra, o magistrado responsável pela acusação a deve sustentar em julgamento:
    1. poderá fomentar a ideia indesejada de que os magistrados do Ministério Público devem ter intuitos persecutórios, a sustentar do início ao fim do processo, quando, em verdade, pelo seu Estatuto, devem antes actuar sempre de forma objectiva e isenta, na busca da verdade material;
    2. não resolve qualquer dos verdadeiros problemas do Ministério Público na área penal, nomeadamente eventuais deficiências na direcção do inquérito ou na intervenção em julgamento;
    3. é absolutamente inexequível em termos práticos e lançaria o Ministério Público e os tribunais criminais num insuperável caos organizacional, com agravamento dramático dos prazos de conclusão dos processos;
    4. significaria o fim da especialização no Ministério Público, que, assim, se veria incapaz de investigar qualquer tipo de criminalidade mais complexa;
  19. Em alternativa, deverão criar-se as condições, nos diferentes níveis hierárquicos do Ministério Público, que permitam o recurso casuístico a essa solução, de acordo com a natureza e complexidade de cada processo, relembrando que tal não é inédito, sendo possível no actual quadro legal desde que efectivados mecanismos de coordenação e coadjuvação de que a estrutura hierárquica do Ministério Público já hoje dispõe;
  20. Relembrar que casos mediáticos, demagogicamente tratados, não devem precipitar soluções legislativas desinseridas do contexto sistemático e da filosofia subjacente. Por exemplo, não é compreensível permitir que, durante o inquérito, o Juiz de Instrução, cuja única função nessa fase é a de assegurar o respeito pelos direitos fundamentais do arguido, sendo por isso chamado de “juiz das liberdades e garantias”, possa aplicar medida de coacção mais gravosa do que a requerida pelo Ministério Público, assumindo assim um interesse activo no exercício do poder punitivo do Estado que ultrapassa o do próprio Ministério Público, responsável pela investigação;
  21. Manifestar publicamente a sua apreensão pela indefinição existente quanto ao futuro da orgânica judiciária.

Monsaraz, 2 de Outubro de 2011

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