O apuramento da verdade dos factos que envolva um incêndio só é possível com uma investigação cuidada, exaustiva e respeitando as melhores práticas científicas existentes

A investigação de um crime de incêndio é uma operação extremamente complexa. Quando se trata de investigar um incêndio florestal é importante determinar qual o ponto onde se iniciou a ignição, qual a causa da mesma, como se efectuou a propagação do fogo, quais os prejuízos que causou e se colocou em perigo a vida ou a integridade física de outrem ou bens patrimoniais alheios de valor elevado.

Para além destes aspectos importa ainda aferir se houve vítimas que ficaram em situação económica difícil ou se o agente do crime actuou com intenção de obter benefício económico.

Todas estas circunstâncias são extremamente importantes na determinação da pena a aplicar ao agente do crime.

O crime de incêndio é caracterizado como um crime de perigo concreto, ou seja, em termos simplistas alguém poderá ser punido por este crime se causar perigo para a vida ou integridade física de outrem, ainda que não se atinjam estes bens jurídicos. A simples criação do perigo é suficiente para a punição.

No entanto, um incêndio poderá ser utilizado como um meio directo para a prática de outro crime, designadamente de homicídio. Se alguém fechar uma pessoa em casa ou num automóvel, incendiar esse local e provocar a morte daquela, estaremos perante a prática de um crime de homicídio.

Pode haver ainda situações mais complexas em que um incendiário ateia fogo e representa como possível que a sua conduta possa matar alguém, o que efectivamente vem a acontecer. Nessa situação poderemos estar perante a prática de um crime de homicídio cometido com dolo eventual.

Não se trata de uma hipótese académica, uma vez que já alguns arguidos foram acusados por factos imputados nestes termos.

O crime de incêndio também é punido em virtude de uma acção humana negligente, a causa mais comum.

As queimadas, os foguetes, os cigarros e o trabalho com certas máquinas agrícolas e industriais junto a pasto seco, entre outros, dão origem a muitos incêndios.

Só não se verifica a prática do crime mencionado, quando a causa que origina o fogo é natural, designadamente trovoadas.

É de salientar que, estatisticamente, as causas naturais são responsáveis por uma percentagem muito reduzida de incêndios.

Nas situações em que se encontram cadáveres no local onde ocorreu o incêndio é necessário efectuarem-se autópsias médico-legais para que se determine a causa da morte de cada uma das pessoas.

Pode acontecer que, aparentemente, alguém tenha morrido por causa de um incêndio quando já tinha falecido anteriormente por outra razão.

Já houve casos em que, após um homicídio, o autor do mesmo incendiou o local do crime para dificultar a identificação do cadáver.

O apuramento da verdade dos factos que envolva um incêndio só é possível com uma investigação cuidada, exaustiva e respeitando as melhores práticas científicas existentes.

A investigação criminal tem um tempo próprio para apresentar conclusões rigorosas, assentes em factos científicos.

Quem investiga deve fazê-lo serenamente e realizar todas as diligências pertinentes, sem se deixar condicionar por agendas políticas ou mediáticas.


Sábado.pt – 25-07-2017, por António Ventinhas

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