“O anúncio de que o “descongelamento” das carreiras não irá operar plenamente este ano só demonstra que ainda nos encontramos num regime de austeridade.” Esta é a semana da entrega do Orçamento do Estado por parte do Governo.

Até ao final do ano a discussão deste documento irá condicionar toda a agenda política e legislativa.

O orçamento de Estado não é neutro e consubstancia uma determinada visão ideológica que se pretende para o País. A escolha sobre quem deve suportar mais ou menos impostos e qual o papel que se deseja que o Estado assuma é determinante para as opções a tomar.

A alocação de verbas a cada Ministério também elucida qual a importância que se dá a cada sector.

Ao longo dos anos, as funções soberanas do Estado perderam expressão orçamental.

O Ministério da Justiça encontra-se privado dos recursos necessários para desempenhar as suas funções em plenitude.

Em momento recente foi anunciada uma grande reforma do sistema prisional que prevê um investimento de 400 milhões de euros nos próximos anos.

Trata-se de uma reforma que já tarda e é anunciada há muitos anos, por diversos governos, sem nunca ter sido concretizada.

No ano de 2004, o relatório elaborado pela comissão para o debate da reforma do sistema prisional, presidida pelo Professor Diogo Freitas do Amaral, elencou diversas medidas que ainda não foram implementadas.

Esperamos para ver qual o valor que será orçamentado para o próximo ano, de modo a concretizar esta reforma.

O orçamento de Estado é um instrumento essencial para a gestão do País, mas por vezes limita a actuação politica ao curto prazo.

Numa altura em que se pretende vender o Estabelecimento Prisional de Lisboa sugiro que se revisite o projecto inicial do Campus da Justiça de Lisboa.

O Palácio da Justiça de Lisboa foi inaugurado no dia 30 de Setembro de 1970.

A área coberta onde funcionam os tribunais cíveis tem cerca de 4.200 metros quadrados e o edifício onde funcionava antigamente o Tribunal de Policia e Execução de Penas tem cerca de 2.000 metros quadrados.

No projecto inicial constavam 4 edifícios dispostos numa ampla praça e que se destinavam igualmente a instalar os tribunais criminais e superiores, acrescentando mais dois edifícios aos que existem agora.

O mesmo nunca foi concluído porquanto dependia da demolição prévia do Estabelecimento Prisional de Lisboa.

Com a desactivação deste, estão criadas as condições para a construção de um Campus da Justiça de raiz.

A concepção arquitectónica do Palácio da Justiça de Lisboa, a sua dimensão e as obras de arte que se encontram no mesmo, apresentam-nos uma visão que valoriza a Justiça na nossa sociedade.

A simbologia associada à Justiça é extremamente importante e a mesma tem sido descurada, com a instalação de tribunais em apartamentos de habitação ou outros edifícios inapropriados.

Quem tenha uma visão de longo prazo para a Justiça não pode deixar de equacionar uma solução permanente para as instalações onde a mesma é administrada.

O actual Campus da Justiça de Lisboa foi inaugurado no ano de 2009 e, segundo tem sido noticiado, paga rendas anuais de cerca

de 12 milhões de euros.

Se fizermos as contas, desde o início do seu arrendamento já foram gastos quase 100 milhões de euros para pagamento de rendas, sendo certo que o Estado nunca ficará como proprietário dos imóveis.

O Palácio da Justiça de Lisboa custou 240 mil contos em 1970 e ainda contínua funcional, evitando assim que o Estado tenha despesas fixas com o pagamento de rendas.

O Estado pagará quase 150 milhões de Euros em rendas pelas instalações do Campus de Justiça de Lisboa, por cada 10 anos que passarem.

Porque é que não projectamos os investimentos na área da Justiça a longo prazo? Penso que daqui a 30 ou 40 anos a Justiça ainda será administrada em Lisboa e continuaremos a precisar de edifícios para o efeito…
A acumulação deste tipo de gestão ao longo dos anos conduziu-nos ao estado actual.

Desde 2005 que as progressões por antiguidade na função pública e para os magistrados se encontram congeladas, tendo sido interrompidas temporariamente por questões eleitorais.

O conceito de carreira desapareceu por completo face às políticas seguidas.

O anúncio de que o “descongelamento” das carreiras não irá operar plenamente este ano só demonstra que ainda nos encontramos num regime de austeridade.

por,  António Ventinhas  

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SABADO.PT  – 11-10-2017

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