SABADO.PT  – 01-08-2018

As parcerias público-privadas não são uma inovação dos tempos actuais, ao contrário do que se possa pensar.

Sempre que o poder público não tem os fundos necessários para atingir os seus objectivos recorre à colaboração de entidades privadas.

O Império romano recorreu com muita frequência a este mecanismo.

Os publicanos referidos nos Evangelhos financiaram obras públicas romanas e em contrapartida ganharam o direito de poder cobrar impostos a certas comunidades, o que os tornou extremamente impopulares.

Na Idade Média, a colaboração de particulares com o poder régio foi muito acentuada.

Em Portugal, as ordens militares tiveram um papel muito importante na conquista do Sul do País.

Os descobrimentos foram a nossa parceria público-privada de maior sucesso.

O rei só por si não possuía os fundos necessários para financiar e gerir um Império que se estendia por vários continentes.

Em muitos países há exemplos em que as parcerias público-privadas foram favoráveis para ambas as partes. Se assim é qual a razão porque entre nós este mecanismo goza de má reputação?

A resposta é muito simples, em quase todas as parcerias público-privadas realizadas em Portugal o Estado ficou extremamente prejudicado.

Muitos dos contratos de parceria assinados entre entidades públicas e privadas apresentam-se aparentemente como parcerias, mas os seus propósitos são bem diferentes.

Não podemos falar de parcerias quando os contratos tutelam essencialmente uma das partes e são elaborados pelos escritórios de advogados contratados pela parte privada.

A existência de cláusulas leoninas que constam em determinadas parcerias nunca seria aceitável noutras situações.

As taxas de rentabilidade das partes privadas contantes nos contratos saem muitas vezes dos padrões normais.

Se o negócio corre favoravelmente para o Estado, o contrato é renegociado de forma a beneficiar os privados.

Se a evolução é favorável aos privados, o contrato tem de ser cumprido até ao fim.

As parcerias público-privadas rodoviárias são um bom exemplo do que não deve acontecer.

Para além de eventual responsabilidade criminal que possa existir e sobre a qual não me pronunciarei, é hoje claro que muitos dos acordos celebrados foram extremamente negativos para o Estado.

A forma como se efectuaram estimativas de tráfego desafiou as regras da experiência comum, mas quem pagou no fim foi o contribuinte.

Os grandes beneficiários desses “erros de cálculo” foram as empresas do costume…

Quem negoceia contratos em nome do Estado deve defender intransigentemente o interesse público e não ceder a entidades privadas com o objectivo de obter proveitos económicos no imediato ou no futuro.

Os negócios ruinosos das PPPs rodoviárias irão condicionar o investimento público durante muito tempo.
Há falta de infra-estruturas em sectores chave como a Saúde ou a Justiça, mas assumiram-se compromissos colossais com o pagamento de verbas para auto-estradas em que ninguém circula.

Num país com recursos limitados, os mesmos têm de ser bem geridos, o que manifestamente não tem acontecido.
Numa casa mal governada nunca há dinheiro suficiente.

Durante esta semana tem sido anunciado que se prepara um pacote de incentivos para os médicos que se fixem fora de Lisboa e Porto, o que acho positivo.

Quando a direcção do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público apresentou uma proposta ao Ministério da Justiça para estabelecer um incentivo para captar mais procuradores para o Departamento Central de Investigação e Acção Penal, a mesma foi negada, tendo sido alegada que não havia disponibilidade financeira para o efeito.

O departamento em causa é aquele que investiga os grandes processos de criminalidade económico-financeira ( como a investigação das PPPs rodoviárias). Talvez por isso se compreenda a dualidade de critérios no estabelecimento de incentivos…
Com o tempo vai sendo cada vez mais claro porque durante anos não se deram condições ao Ministério Público e à Polícia Judiciária para exercerem as suas funções, o mais grave é que nada se tem alterado para reverter substancialmente a situação.

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por, António Ventinhas

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