BOLSA DE ESPECIALISTAS
VISÃO, 06-07-2020 por Adão Carvalho, Secretário-Geral do SMMP

As férias judiciais não devem confundir-se com as férias dos magistrados, pois estes como qualquer outro trabalhador da função pública apenas têm direito a 22 dias úteis de férias por ano
 

O artigo 28º da Lei da Organização do Sistema Judiciário estabelece que as férias judiciais decorrem de 22 de dezembro a 3 de janeiro, do domingo de Ramos à segunda-feira de Páscoa e de 16 de julho a 31 de agosto.

 As férias judiciais não devem confundir-se com as férias dos magistrados, pois estes como qualquer outro trabalhador da função pública apenas têm direito a 22 dias úteis de férias por ano.

A diferença em relação aos demais funcionários públicos é que os magistrados só podem escolher as suas férias pessoais dentro dos limites das férias judiciais, apenas podendo gozar nos dias imediatamente anteriores ou posteriores se este período não permitir o gozo do período de férias pessoais de forma contínua.

Mesmo no período das férias judicias os tribunais continuam em funcionamento, continuando a ser tramitados os processos das várias jurisdições que têm, por força da lei, natureza urgente e aqueles a que seja atribuída tal natureza pelos próprios magistrados e que compreendem uma panóplia cada vez mais significativa de processos.

Basta pensarmos que todos os processos em que são investigados crimes de violência doméstica têm natureza urgente e são tramitados durante as férias judiciais por magistrados escalados em turnos para o efeito.

A razão da existência de um período de suspensão da atividade normal dos tribunais e que se designou por férias judiciais nada tem a ver com qualquer privilégio dos magistrados.

Aliás, quando em 2005 o primeiro ministro na altura anunciou a redução das férias judiciais de dois para um mês, como a grande medida do Governo para combater a morosidade da Justiça e promover a celeridade processual, logo da sua implementação se percebeu que não passava de uma medida marcada pela leviandade e pela demagogia, que conduziu a uma alteração legislativa no sentido de estabelecer o período das férias judiciais tal como hoje está consagrado.

Os tribunais não congregam apenas o trabalho dos magistrados, mas dos funcionários judiciais e dos advogados.

A concentração num determinado período de tempo, como é o caso das férias judiciais, do gozo de férias pessoais de todos os magistrados e funcionários de justiça é o que melhor satisfaz as necessidades de celeridade da justiça.

Não podendo os tribunais parar um único dia, porque existem detidos, presos, crianças em risco, procedimentos cíveis que impõe a tomada de uma decisão cautelar imediata e muitos outros processos com natureza urgente, qualquer outra solução trará necessariamente maiores embaraços e poderá, mesmo, implicar um tempo de paragem superior ao das férias judiciais.

Veja-se, por outro lado, que os tempos de paragem das férias judicias correspondem ao período de gozo de férias de verão da maioria das pessoas e o natal e a páscoa alturas em que muitas pessoas estão ausentes do seu domicílio por motivo de férias ou para celebrarem as referidas festividades com a família alargada e que, por tais circunstâncias, a realização de diligências processuais como julgamentos, nesses períodos, que implicam a presença de testemunhas, das partes, advogados, peritos, polícias, apresentariam necessariamente índices de não comparência elevados.

Para os magistrados o fim das férias judiciais não é dramático, antes permitiria que pudessem gozar as férias noutras alturas do ano como acontece com qualquer funcionário do Estado.

O assunto não pode é ser abordado de forma populista e demagógica como se a discussão fosse em torno das férias dos magistrados.

Alguns países da europa têm férias judiciais, outros não e, os tempos das férias judiciais ou equivalente são variáveis de país para país.

É uma opção política que, como resulta da experiência do passado, pode até ser fator de maior entrave à celeridade da justiça que o contrário.

Aliás têm sido os advogados que mais têm lutado contra o fim das férias judiciais ou o seu encurtamento, porque sendo uma classe profissional onde a prática isolada ainda é a dominante, tal poderia comprometer, para muitos, o seu direito a uns dias de descanso.

É uma matéria que diz respeito ao sistema judiciário na sua globalidade e não apenas aos magistrados e que, por isso, implica uma reflexão serena com ponderação das vantagens e desvantagens da sua implementação.

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