Notícias do dia

OPERAÇÃO MARQUÊS EM RISCO

MP ainda não recorreu

Julgamento de Vara e Salgado criam imbróglio jurídico

Primeira Sessão

Julgamento de Salgado e Vara põe Marquês em risco

ADIADO. Ex-banqueiro no banco dos réus para a semana, ex-ministro julgado já amanhã
IMBRÓGLIO JURÍDICO. Juiz reconhece que não é normal a separação dos processos, mas assegura que não tem fundamentos para evitar o julgamento

Devia ter começado ontem, mas foi adiado durante uma semana. Foi essa a ordem do juiz Francisco Henriques, que determinou que Ricardo Salgado começasse a ser julgado na próxima segunda-feira. Antes disso será Armando Vara, também no processo Marquês – o julgamento começa amanhã – uma decisão que pode pôr em causa o recurso do Ministério Público.

“Não é normal haver este tipo de separação, mas enfim. Não vejo fundamento para não fazer o julgamento”, disse mesmo o magistrado, consciente de que os factos que forem discutidos nos julgamentos que agora se iniciam não podem voltar a ser apreciados, mesmo que o Ministério Público venha a ganhar o recurso e consiga que a acusação que tinha sido proferida vá para julgamento. Advinha-se então um novo imbróglio jurídico. O julgamento de Sócrates e Carlos Santos Silva também deverá ser brevemente marcado, numa altura em que o recurso do Ministério Público ainda nem sequer subiu à Relação de Lisboa.

Ontem, o julgamento de Salgado – que neste novo processo responde por três crimes de abuso de confiança – foi adiado porque o prazo para entregar a contestação só terminava quarta-feira. Francisco Proença de Carvalho não prescindiu dos prazos e o juiz manteve o calendário que já estava marcado para a próxima semana. “Estar com este pingue-pongue não tem efeito válido nenhum. Vou já adiar o de hoje e de amanhã. Os dias 14 e 15 de junho mantêm-se”, disse o juiz que depois ironizou: “Dá-me prazer fazer julgamentos com advogados de gabarito.”

Refira-se que neste processo estão em causa três transferências do BES, num valor superior a 10 milhões de euros, que passaram por contas de Hélder Bataglia, Henrique Granadeiro e o próprio Ricardo Salgado. A primeira testemunha é precisamente Hélder Bataglia, que não deverá depor por ter sido arguido. Segue-se depois José Maria Riccardi, primo de Ricardo Salgado.

PORMENORES

– Novas injeções
O ministro de Estado e das Finanças já disse esperar que “não haja mais chamadas de capital” do Novo Banco em 2022. Contudo, recusou afastar totalmente, garantindo que os contratos são “para cumprir”.

– 700 milhões
Além da participação no Fundo de Resolução, o Estado deverá aplicar diretamente quase 700 milhões de euros no Novo Banco. Esta injeção ‘paralela’ é justificada pelo regime dos impostos diferidos gerados pelos prejuízos da instituição.

– Mecanismo polémico
O contrato de venda de 75% do capital do Novo Banco aos americanos do fundo LoneStar prevê um mecanismo que está na base de muitas polémicas: o Fundo de Resolução comprometeu-se a cobrir até 3890 milhões em perdas do Novo banco com ativos tóxicos herdados do BES.

– Balanço pesado
Segundo o último balanço do Tribunal de Contas, os apoios públicos ao sistema financeiro nacional totalizam 20 761 milhões de euros desde 2008, concentrados nos apoios do BES/Novo Banco, BPN e Caixa Geral de Depósitos.

Novo Banco admite tribunal
O Novo Banco admite ir para tribunal por causa do bloqueio do Ministério das Finanças à transferência deste ano. A instituição diz que “tomará todas as medidas, incluindo jurídicas, para suprir incumprimentos de obrigações legais”.

Menos 112 milhões do que o previsto
O Novo Banco recebeu do Fundo de Resolução 317 milhões de euros. São menos 112 milhões face ao que estava previsto. O Fundo de Resolução diz que o valor bloqueado está dependente de uma avaliação suplementar.

Problema relativo a contas de 2019
O Novo Banco argumenta que a parcela bloqueada não diz respeito às contas do ano passado mas sim de 2019, tendo esta matéria já sido “previamente considerada pelas partes e esclarecida”.

AR quer relatório “secreto”

Os deputados querem acesso ao documento interno sobre a atuação do regulador dos mercados , a CMVM, aquando da resolução do BES em 2014. A pista foi dada aos deputados pelo antigo presidente da CMVM, Carlos Tavares. A existência deste documento . serviu de arranque à audição da atual presidente, Gabriela Figueiredo Dias, com o presidente da comissão de inquérito, Fernando Negrão, a falar num rela -tório “secreto”. “É tão secreto quanto toda a outra atividade de supervisão da CMVM “, reagiu a presidente da CMVM.

A líder do regulador explicou que o documento é meramente factual e que não traz “nada de particularmente novo”, tendo “a maioria” da informação já sido enviada à anterior comissão de inquérito sobre o BES. A informação não foi partilhada porque a CMVM está sujeita ao dever de segredo de supervisão. Fernando Negrão assinou um despacho a pedir o documento mas, no final da audição, reconheceu que só o Supremo Tribunal de Justiça teria poder para quebrar esse segredo. Os deputados querem ler o documento, com o compromisso de não revelarem o seu conteúdo. “Só não será disponibilizado se existirem questões legais que o impeçam”, garantiu a líder da CMVM.

“Não é o campeão em desvalorizações”

Gabriela Figueiredo Dias reconheceu ontem que o Novo Banco “não é o campeão em todas as desvalorizações” de imóveis, estando dentro de intervalo definido pelo regulador, após a análise aos bancos nacionais. A responsável deu mesmo o exemplo do BCP, onde houve desvalorizações mais acentuadas. No Parlamento, recordou que as diferenças nas avaliações de imóveis entre sociedades gestoras e o Novo resultaram de “pressupostos diferentes”.

Carlos Tavares invoca pandemia para não ser ouvido

Além do relatório confidencial da CMVM sobre a resolução do BES, o antigo presidente do regulador dos mercados “invocou a situação de pandemia” para não ser ouvido presencialmente no Parlamento. Antes dos trabalhos, o presidente da comissão de inquérito, Fernando í Negrão, explicou ao CM que o gestor “sugeriu um documento” que teve de ser identificado pelos deputados.

Trabalhos entram na fase final mas podem derrapar até agosto

A comissão de inquérito sobre as perdas do Novo Banco espera ter os trabalhos concluídos a 15 de julho, segundo o prazo definido por Fernando Negrão. Para os próximos dias, estão agendadas as audições de vários banqueiros bem como do ex-governador do Banco de Portugal Vítor Constâncio. Apesar das férias parlamentares, os deputados têm total liberdade para continuar em agosto.

Ulrich ouvido com compra na mira

É ouvido hoje o presidente (‘Chairman’) do BPI, Fernando Ulrich. O banqueiro admitiu, em 2014, o interesse na compra do Novo Banco e assinou um acordo de confidencialidade para estudar o dossiê, mas não avançou.

ATUALIDADE II

QUEDA DO BES

SALGADO | NÃO FOI AO JULGAMENTO
Ricardo Salgado não compareceu ao seu próprio julgamento, alegando falta de condições de segurança devido ao quadro pandémico. 0 ex-banqueiro tem 76 anos e segundo o seu advogado só deverá comparecer caso queira prestar depoimento. Não o deverá fazer na próxima segunda-feira.

CONTESTAÇÃO | TEM 150 PÁGINAS
Francisco Proença de Carvalho anunciou que a sua contestação terá cerca de 150 páginas. Ao tribunal, ainda pediu que o adiamento do julgamento fosse mais prolongado, para que juízes e procuradores analisassem os seus argumentos. O magistrado não concordou e manteve as datas já decididas.

EXPECTATIVA | LUCROS
O NOVO BANCO ESPERA ALCANÇAR LUCROS DE 154 MILHÕES DE EUROS NESTE ANO, PELA PRIMEIRA VEZ DESDE QUE A INSTITUIÇÃO LIDERADA POR ANTÓNIO RAMALHÓ FOI CRIADA.

PROCESSO | APRENDIZAGENS
A presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) reconheceu ontem que o caso do BES trouxe muitos ensinamentos para a atual atuação do regulador, inclusive em matérias como a exposição de risco. Recorde-se que o relatório Costa Pinto apontou falhas na relação entre o Banco de Portugal e a CMVM.

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Presidente do Supremo pede maior punição da corrupção

O novo presidente tomou ontem posse na presença dos chefes de Estado e de Governo e deixou um apelo à classe política Sociedade, 14

Novo presidente do Supremo desafia políticos a punir corrupção com mais vigor

Henrique Araújo deixa referência implícita à criminalização do enriquecimento ilícito na sua tomada de posse

O novo presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Henrique Araújo, declarou ontem no seu discurso de tomada de posse que a sociedade exige melhores punições para os crimes de colarinho branco.

Sem nunca se referir explicitamente à criminalidade económico-financeira, o magistrado falou do descontentamento da sociedade em relação a condutas consideradas reprováveis. A da necessidade, a este propósito, de uma “actuação legislativa pronta, sobretudo na área penal, através da criação de novos tipos legais de crimes ou da adequação dos existentes à escala de valores por que a sociedade actualmente se rege”.

Já no passado, quando dirigia o Tribunal da Relação do Porto, Henrique Araújo tinha defendido o agravamento das penas dos crimes relacionados com a corrupção. Desta vez, e perante “a reiterada impossibilidade de se alcançarem soluções consensuais na área da justiça”, o magistrado afirmou que se impõe “que o poder legislativo assuma, sem hesitações, as suas competências”, adaptando o Código Penal e restantes instrumentos legais às novas práticas criminosas. Ficou claro que o novo presidente do Supremo defende a criminalização do enriquecimento ilícito, mesmo não o tendo dito com todas as letras.

O magistrado deixou ainda um aviso à navegação: “A inércia do legislador, quando prolongada, aumenta a distância entre a lei e a realidade, abrindo espaço à desregulação e à impunidade.”

Henrique Araújo falou também dos danos no seu entender irreparáveis que os megaprocessos criam à imagem da justiça. “O sentimento de descrença no aparelho de justiça resulta da expectativa frustrada dos cidadãos na resolução rápida de processos criminais de grande envergadura em que, geralmente, são visadas figuras da sociedade com notoriedade pública”, descreveu, explicando que as estatísticas internacionais mostram que a generalidade do sistema judicial português não é mais lento do que os de muitos outros países.

Henrique Araújo

Presidente do Supremo Tribual de Justiça

Porém, o arrastamento dos grandes processos, “seja pela sua complexidade intrínseca, seja pelos expedientes usados para tornar mais longínqua a decisão final, cria um dano irreparável na imagem da justiça, infligindo simultaneamente um desgaste na confiança do sistema”, lamentou.

Os expedientes dos arguidos

“É este o principal problema com que a justiça dos tribunais comuns actualmente se defronta, e que demanda uma especial atenção por parte das entidades responsáveis”, desafiou o novo presidente do Supremo, antecipando um aumento da procura dos tribunais por via da crise económica e social gerada pela pandemia.

Os expedientes a que recorrem alguns arguidos para arrastar os processos durante anos, graças às imensas possibilidades que a lei lhes abre a esse nível, também não escaparam às críticas de Henrique Araújo. Nem isso nem as sentenças demasiado longas e rebuscadas que muitos juízes proferem. “Escreve-se muito. Consomem-se, sem critério, dezenas ou centenas de páginas em argumentações desprovidas de interesse e em repetições escusadas”, assinalou o juiz. “É cada vez mais frequente depararmos com despachos ou sentenças cuja leitura se transforma num difícil exercício.”

Não cumprirá mandato todo

Os 67 anos de Henrique Araújo não lhe deverão permitir cumprir o mandato até ao fim, razão pela qual poderá ter de abandonar o cargo daqui a três anos, quando completar as 70 primaveras. Porém, segundo algumas interpretações da lei, essa regra poderá não se aplicar a mandatos já iniciados.

O novo presidente do Supremo é de Arcos de Valdevez, tendo-se licenciado em Direito em Coimbra em 1978. Chegou a integrar o conselho geral da Associação Sindical de Juízes Portugueses e também o Conselho Superior da Magistratura. Quando dirigia o Tribunal da Relação do Porto, mostrou-se particularmente crítico do comportamento das figuras públicas suspeitas da prática de crimes.

“Quando uma personalidade de vulto é apanhada nas malhas da investigação criminal, a frase que imediatamente se apresta a disparar é: ‘Aguardo serenamente o desenrolar do processo e colaborarei com a justiça no que for necessário para que se apure a verdade.’ Porém, quando o tribunal decide, logo se solta a revolta do visado, que, invariavelmente, reclama inocência”, observava o juiz-conselheiro numa intervenção pública no final de 2016.

A impossibilidade de se alcançarem soluções consensuais na justiça impõe que o poder legislativo assuma, sem hesitações, as suas competências

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